Se conseguisse escrever sobre os meus terrores, explicar-tos-ia a todos. Sei que há em ti a luz que os afasta. Embora por vezes eles venham, me silenciem em forma de pequenas gotas que correm sem quererem ser vistas. Afogo-me em silêncios de fúria, uma raiva sem causa aparente. Algo que nunca consegui explicar a mim mesma o porque de existir. São revoltas que chegam sem pré-aviso de que o bilhete de partida ainda não está garantido. Tantas vezes até os dedos calaram. Mas… A tua luz, a tua cor… Até a este Presente, manteve tudo longe, pudesse ser assim para sempre, afastar a noite escura que com umas enormes garras me leva a embarcar no maior dos navios das lembranças. Este monstro que aparece vindo não sei de onde, e ataca todas as certezas, que abala toda a minha segurança, e me faz recuar, empurra-me! Tanto, que deixo as marcas na areia de ser arrastada… O rasto que tento voltar a seguir enquanto o mar não apaga, enquanto o sol volta a arder.

 

Oh mente dividida! Oh ser de duas almas!

Teimosia esta, que metade de mim sou eu, a outra a que me tenta educar! Insistência esta, de metade que quer permanecer em mim, que me desordena as ideias, os ideais. És tu, que te emaranhas na solidão do escuro enquanto a luz emana… E és tu, que puxas o fio da malha para desfazer o que até aqui montei de verdades absolutas, e sonhos concretos.




Dos meus olhos um dilúvio. Da minha alma temporal.
Foi no inicio ou fim do Inverno, não me recordo bem. Sei que estava frio, eu levava o meu cachecol castanho e cor de laranja que dava sempre para as duas. Depois de um dia maravilhoso, quase perfeito. Daqueles em que cada segundo é a peça perfeita de um puzzle que nos acompanhará para sempre. Entre gargalhadas, a paixão que transpirava de vocês e que eu pude retratar, que se lia nos vossos olhos. Chegámos a ser o trio mais divertido que andava por aquelas ruas. Os nossos olhos brilharam tanto quanto as luzes ao fundo com o chegar mais cedo da noite. Mais gargalhadas e ficaste em baixo da água gelada, culpa dele. Só me consegui rir com o nervosismo do pobre rapaz, e a tua fúria. Ver-vos era como assistir a uma peça improvisada de amores proibidos mas tão desejados. Parecia tudo tão real (e era) e perfeito visto da primeira fila. Eu sempre fui capaz de ver nos teus olhos, nas tuas expressões aquilo que me querias dizer, que sentias. E por isso, quando no meio da noite já cerrada se ergueram os pequenos jactos de água nos jardins que contemplávamos enquanto caminhávamos pelo passeio, paramos, estáticas, olhamo-nos uns cinco segundos. Rasgou-se um sorriso, daqueles que já vêm da nossa inocência… Tiramos os cachecóis, os casacos, lançamos tudo para os braços dele e corremos em direcção ao jardim… Gritámos entre gargalhadas enquanto aquelas gotas nos limpavam a alma. Corremos como duas crianças na relva molhada pelos jactos de água até nos cansarmos.
Guardo de ti, a lembrança de momentos únicos, da cumplicidade desde que nos lembramos. Mas também guardo de ti, a última vez que li nos teus olhos uma tristeza absoluta, uma névoa sobre ti e mais não consegui ler, porque os teus olhos postos no chão não deixaram. Se um dia achei que eras mais rebelde, que eras mais arisca, que não te prendias a ninguém dessa forma… O contrário está escrito. Essa não és tu, precisas de viver e de espaço para respirar. Volta a ti.
As tuas palavras ruminaram em mim, consumira-me durante horas. Roeram pedaços meus. Queria dizer-te com certezas, que sim! Que vou! Sabes disso… Mas também me invade o medo de lhes virar as costas, o receio de ficar sem qualquer varão nestas escadas íngremes. Mas isso seria ultrapassável, fosse apenas eu poder ir, agora. Iria já! Estaria contigo daqui a algumas horas, e para o sempre que tivesse que ser. Deixaríamos o desfazer das malas para amanhã, porque hoje quereria decorar os teus traços, contemplar cada palavra e riso e degustar o máximo de expressões que conseguisse.


Doeu não o facto de as teres dito, mas a sensação de que poderias realmente sentir aquilo. Mas… Caminhando pelos meus raciocínios… Cheguei á conclusão, de que se eu não quisesse, seria simplesmente porque não sentiria o que sinto em relação a ti (este gostar imenso que era capaz de rasgar no céu milhões de pássaros acartando cada um grandes pedaços do que tenho de mim para ti) então aí, seria porque não teria sentimentos, eu não seria nada, apenas um holograma, porque as reacções visíveis existem e se elas não fossem espelhos do sentimento, então era porque eram nada, sendo elas nada, sinto-me eu nada também. Concluindo, se os meus sentimentos não existem e eu os sinto tão bem, então também eu não existo. Tudo o que me rodeia e faz parte de mim poderá ser apenas uma utopia. Algo criado por um ser cuja imaginação e sensibilidade (e bom gosto) se destacam de tudo o resto. Um mundo assim. (Presunçosa!)


Portanto… Sendo ou não real, existindo ou não, neste mundo, eu, pessoa criada pela mente de alguém, sinto realmente que quero. Tomei hoje um passo, amanhã tomarei outro, e outro, e assim sucessivamente. Até ao dia em que consiga dar o salto, o grande passo, o passo final com um inicio desejado.


Espera-me. Não desesperes porque eu realmente quero. E vou conseguir.

(Re)Encontro

      São 16horas! Certas, sem mais nem menos um minuto. Corro porta fora após pegar na mala, chaves do carro e telemóvel. Não vou certificar-me que nada me falta, porque o mais importante, a minha presença, apresso-me por não faltar! Fecho a porta e sigo em direcção á porta do elevador. Felizmente é rápido e já cá em baixo corro para o carro. Meto-me a caminho, já lá devia estar. Os cinco minutos que me separam da praia, local de encontro vão fazer diferença. Não gosto de a fazer esperar e isso deixa-me ainda mais nervosa. Não nos vemos há tanto tempo e perder já estes pequenos inícios do nosso momento de reencontro… Sinto-me a sufocar! Vou perdida em mil pensamentos e lembranças.
        Estaciono o carro perto do café, aquele em que passámos horas intermináveis a conversar sobre tudo. Ainda não estás lá, para surpresa das surpresas. Olho bastante intrigada, não és de te atrasar, mas, passou tanto tempo… Saio do carro, quero confirmar. Respiro fundo, não… Não estás. Vou sentar-me na nossa mesa e peço um copo de água por agora. Sinto que a minha boca mais parece um deserto. 

      Fecho os olhos e inspiro. Expiro suavemente enquanto os volto a abrir para ver o mar. Cheira a maresia, como os nossos cabelos após longas tardes de mergulhos no mar. Aquele cheiro que ficava até ao Outono em nós. Depois vinha o cheiro da terra molhada com os passeios pela mata. Já passaram 15 minutos. O céu começa a tonificar-se com o final da tarde mas a linha de horizonte ainda se dissolve com o azul do céu. Como se não houvesse separação. Assim como em nós que sempre aparentamos ser inseparáveis fisicamente (porque te tenho e tive sempre no coração) a vida tratou de nos colocar o horizonte no meio. 
      Um suave toque no ombro interrompe-me o pensamento. Avanças para a minha frente, eu levanto-me de imediato e abraçamo-nos. Já sinto o suave aroma ás tuas pastilhas de mentol. Algo que nunca deixaste noto. Sentir o calor do teu abraço faz com que os meus olhos se encham da água salgada do mar, talvez toda aquela que engolia por entre as nossas brincadeiras nele. Não escondes que também choras. Olhamo-nos nos olhos, mas ainda não foi suficiente. Voltamos a abraçar-nos por todo este tempo. Por todos os momentos em que choramos sozinhas no escuro e não podemos abraçar-nos desta forma.

      Sentamo-nos e pedes dois chás de menta. Enquanto por entre o inspirar do fumo alcatroado de um cigarro e tragos pequenos no chá cujo aroma a mentol nos envolvia e confortava. Ficámos a conversar até o sol se querer  esconder.

      Decidimos ir passear na praia. Como naquela vez em que estavas de coração destroçado e querias fugir de casa. Fugi contigo para ali, e passeamos até ao amanhecer. Paramos a olhar o céu, uma janela de cores. O sol reflectido no mar, grandioso. A imagem arrasta-se até a areia molhada que pisamos. As réstias de água fazem de espelho ás nuvens que se embelezam de mil tons. Beijamos as nuvens com os pés descalços e continuamos, deixando na sua imagem espelhada a nossa marca.

Criemos um mundo..

     Um sorriso especial, uma voz interior. Um banco castanho com desenhos em cor de laranja, os nossos nomes escritos. Esse banco num jardim, cheio de flores, de árvores, animais. Um jardim imenso, para passear-mos sempre, com um sol inalterável, para que os dias cinzentos lá sejam curados.
     No fim do jardim, além, na linha do horizonte, o nosso mar. Ora sereno, ora áspero e irritado, como se a nossa ira estivesse nele. Ele engole-a para que a paz interior reine em nós. O nosso lugar na areia, o melhor para nos sentarmos a contemplar o nascer e o terminar de cada dia. As cores imensas, as paisagens diferentes todos os dias, mas o nosso mesmo lugar de sempre. Sentamo-nos nele, eu contigo e tu comigo em mente. Para que os negros, os momentos mais baixos de nós, sejam elevados, iluminados e de novo coloridos ali. Caminhemos para lá, sempre que não poder dizer-te que ficará tudo bem,
que estou contigo e dou-te força em tudo.            
     Caminhemos para lá em busca daquilo que queríamos ouvir, eu de ti, e tu de mim. Para que não existam desistências ou fracassos em nós, nutramos este mundo perfeito em dias de tempestade. 
Pensemos em nós.

Pressinto-te...


         Pressinto-te chegar. Algo em mim me diz que estás por perto, meu corpo deseja-te. Continuo a fazer o jantar. Saí do banho, estou nua, porque sei que pouco tempo falta para chegares. Sei que ficas louco por dentro, que todo o teu corpo vibra depois de um dia exasperante, dares de caras com tal situação. Conheço-te cada fraqueza. O beijo bem dado, a brincadeira que começa sempre pelo piercing (que me deixa louca) no teu mamilo.
         Ouço-te pousar a mala, descuido teu, foste descoberto, mas ainda assim, finjo que não. Em passos leves, sei que entras na cozinha e me vês assim, de costas, o calor do teu corpo. Sinto-o a metros de distância. Agarras-me firmemente envolvendo-me com os teus braços, enquanto me beijas a nuca. Deixas-me louca, e hoje estou cheia de vontade de ser consumida por ti, em todo o lado, de todas as formas. Sentir a tua essência, beber-te cada toque suave.
         Em alguns segundos e já te fazes sentir, naquele jogo de ancas, em que nos provocamos e tentamos ver quem mais tempo consegue resistir. Eu ganho sempre. Tu és fácil de seduzir. Talvez por todas as provocações que teimo em fazer-te no teu horário laboral, sei sempre que chegas cheio de vontade de fazer amor. Um amor louco!
         Viras-me, agarras-me as mãos e encostas-me à parede gelada. Sabes o quanto isso me excita. Beijas-me. Sinto o calor da tua boca percorrer-me o pescoço, os ombros, os mamilos, o umbigo… Paras. E olhas-me com olhos de pecador. Sou eu o teu pecado. Com a ponta da língua, contornas aquilo que mais queres. Agarro-te os cabelos, tremo de prazer e vontade de sentir o toque aveludado da tua língua em mim. Já não consigo fazer-te parar. Possuis-me! Até saberes que estou prestes a detonar e sobes o teu corpo e entregamo-nos ali, contra aquela parede gelada… Que se falasse…
 Sorrio-te no final. Fico a tratar do jantar. Vais tomar um duche. Eu trinco os lábios… Acabamos depois...

Vamos?

Sorri-me hoje que o mundo não me sorri. Acalma-me hoje, que o universo decide envolver-me no seu lado feroz de abandono, e me cerra na sala escura. Fica comigo hoje que o tempo não me trás a sua companhia, que os relógios solidificaram as horas em que eu conseguia sorrir. Alimenta-me a alma de ilusões impossíveis de desvanecer. Fica comigo no limiar do horizonte para ver-mos o dia extinguir, e o novo germinar. Aceita o meu reflexo, que a imagem real de mim é inexistente. Salta do penhasco comigo, para provarmos a perpetuidade de um amor incondicional. Fica comigo no agora constante que é o passar de cada minuto. Mostra-me os degraus que contigo consigo alcançar. Atinge comigo a vitória. Faz-me tombar para me amparares ao levantar, torna isto a nossa aprendizagem diária de saber viver e crescer. Corro para ti, se tiveres certezas que as mudanças são toleráveis, que saberei cuidar de ti, e tu de mim. 



Quero(-te) muito.